Cenário atual do PERSE: entenda as últimas atualizações do programa de benefícios
Desde a sua promulgação, a Lei que trata dos incentivos fiscais para o setor eventos vem sendo alvo de críticas em relação as últimas alterações promovidas no benefício da alíquota 0, prevista na Lei nº 14.148 de 2021.
Após diversas intervenções do governo que visavam restringir o acesso das empresas ao benefício, podemos observar algumas recentes decisões favoráveis aos contribuintes.
Por este motivo, resolvemos trazer novas reflexões sobre o tema e apresentar o caminho a ser seguido pelos empresários que fazem jus a este benefício.
O que é o benefício do PERSE?
A lei do PERSE além de permitir, no passado, o pagamento de débitos inscritos em dívida ativa em até 145 parcelas e com desconto de até 100% sobre multa, juros e encargos, prevê a redução à 0% das alíquotas de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS por 60 (sessenta) meses, a contar de 18 de março de 2022.
Benefício significativo por sinal, já que carrega consigo uma excelente redução na carga tributária para permitir que os empresários e empreendedores do setor de eventos possam ganhar um fôlego para retomada de suas atividades.
Interessante dizer que são diversas as atividades que podem ser beneficiadas, dentre elas, bares, restaurantes, transporte de passageiros, operadores turísticos, agências de viagem e outras.
O que ocorre é que o Ministério da Economia publicou a Portaria ME nº 7.163/21 para regulamentar o enquadramento aos benefícios em discussão de acordo com os códigos de atividades beneficiados.
Posteriormente, a Portaria ME 11.266/21 restringiu o número de segmentos beneficiados, excluindo 50 atividades que faziam parte do rol da portaria 7.163.
Além disso, um destes dispositivos das portarias limita o alcance do programa para as atividades cujos CNAE`s são referidos no anexo II daquela portaria, exigindo que as empresas fossem inscritas no Cadastro de Turismo (CADASTUR).
Como se não bastasse, a Receita Federal do Brasil – RFB publicou a Instrução Normativa 2114 de 2022 estabelecendo novas limitações para as empresas fazerem jus ao benefício.
Em princípio, a IN 2114 estabeleceu em seu art. 4, que as empresas do anexo II da portaria, para fazerem jus aos benefícios da alíquota 0 deveriam ter o CADASTUR ativo em março de 2022.
Essa é a mesma data da derrubada do veto do art. 4º da Lei 14.148 que trata das alíquotas 0, ou seja, mesma data que esse benefício passou a surtir seus efeitos.
A instrução normativa, também, às margens da Lei, excluiu os benefícios paras empresas optantes pelo regime de tributação do Simples Nacional.
Este ponto já era alvo de críticas e vamos tratar ao final deste artigo.
Por fim, a Instrução Normativa, no § único do artigo 2º, deixou claro que “o benefício fiscal não se aplica às receitas e resultados oriundos de atividades econômicas não relacionadas no caput (…)”.
Significa dizer que não estamos diante de um benefício para toda e qualquer receita da sociedade e sim para os resultados das atividades contempladas pela Lei.
A Lei 14.592 de 2023 e seus efeitos
Desde o dia 18 março de 2022 até o dia 30 maio de 2023 os contribuintes vivenciaram a celeuma apresentada acima. Foi quando tivemos a conversão da Medida Provisória 1.147 de 2022 na Lei nº 14.592 de 2023.
Com as novas alterações, as atividades contempladas pelo benefício passaram a constar do próprio texto do caput do artigo 4º da lei do PERSE, em um número menor do que aquelas originalmente previstas pela primeira portaria de nº 7.163 de 2021, mas não idênticas a portaria 11.266 de 2021.
Da mesma forma, previu a necessidade de observar a segregação de receita e resultados para aplicação do benefício (§1º do art. 4º) e de ter a inscrição do CADASTUR ativa em 18 de março de 2022, como requisito para se alcançar o benefício para algumas atividades específicas (§5º do art. 4º).
Veja que temos uma linha do tempo a observar:
- 03 de maio de 2021 – Publicação da Lei com veto para o art. 4º que previa o benefício da alíquota 0.
- 23 de junho de 2021 – Publicação da portaria nº 7.163 de 2021 com exigência do CADASTUR ativo em na data da publicação da Lei 14.148 para atividades do anexo II.
- 18 de março de 2022 – Derrubada do veto e início da vigência do benefício da alíquota 0.
- 01 de novembro de 2022 – Publicação do IN 2114 com destaque da exclusão do benefício para empresas do Simples Nacional e exigência de CADSTUR ativo em 18 de março de 2022.
- 21 de dezembro de 2022 – Publicação e início dos efeitos da MP 1.147 que abriu oportunidade para nova regulamentação das atividades pelo Ministério da Economia.
- 02 de janeiro de 2023 – Publicação da Portaria nº 11.266 com exclusão de mais de 50 atividades que faziam parte do rol da portaria 7.163 e mantendo a exigência do CADASTUR.
- 30 de maio de 2023 – Conversão da MP 1.147 na Lei nº 14.592 com relação das atividades restritas e exigência do CADASTUR em 18 de março de 2022 no texto da Lei.
Os intervalos temporais acima apontados são de suma importância para os contribuintes, quando da busca pelos seus direitos. Isto porque, embora as limitações sejam amplamente questionáveis, os fundamentos para tal são distintos em relação as disposições legais e infralegais.
As limitações impostas pelas portarias e Instrução Normativa são válidas?
As exigências realizadas extrapolam o que foi trazido pela lei. Além do que, algumas das atividades mencionadas na portaria do Ministério da Economia não estão e não são obrigadas a ter o CADASTUR para desempenhar suas atividades, já que este cadastro é meramente declaratório.
Além disso, as empresas que desenvolvem as atividades previstas no § único do art. 21 da Lei 11.771 de 2008 (Lei do CADASTUR) não estão obrigadas a terem o próprio cadastro.
Como visto, o texto da própria lei instituidora do cadastro do turismo menciona que aquelas sociedades: “PODERÃO ser cadastras no ministério do turismo”. Vejam bem, a lei diz “Poderão” e não “Deverão”.
E para completar, tais impedimentos acarretam a perda de competitividade no mercado em relação as demais empresas que já estão usufruindo destes benefícios.
Claramente não foi objetivo do legislador beneficiar apenas algumas sociedades empresárias, e sim todo o setor de eventos.
Em relação a limitação das atividades, quando da publicação da Portaria ME nº 11.266/21, há flagrante ofensa ao princípio da anterioridade ou “não surpresa”, em virtude da majoração indireta de tributos.
Por haver majorado os tributos das atividades previstas na portaria 7.163, estaríamos diante da necessidade de se respeitar o princípio da anterioridade nonagesimal para a CSLL, PIS e COFINS, que somente poderiam ser cobrados a partir de 02 de abril de 2023.
Em relação ao IRPJ, estaríamos diante da necessidade de se observar a anterioridade anual, ou seja, somente poderia ser cobrado a partir de 01 de janeiro de 2024.
De toda sorte, a portaria 7.163 começou a produzir efeitos a partir de sua publicação em junho de 2021, mas o benefício da alíquota 0 começou a valer a partir de março de 2022 e a Portaria 11.266 começou a produzir efeitos em janeiro de 2023.
Neste sentido, perfeitamente defensável pelas vias judiciais que as receitas advindas das atividades representadas pelos CNAES constantes da Portaria 7.163, excluídos pela Portaria 11.266, sejam, no mínimo, beneficiados pelo interregno de março de 2022 até janeiro de 2023.
E agora com a publicação da Lei 14.592?
A partir da data da publicação da Lei em comento, 30 de maio de 2023, a discussão é outra.
Com a aprovação da Lei em comento e os CNAES previstos em seu texto, a receita das atividades excluídas realmente não poderão, em tese, se valer dos benefícios e a exigência do CADASTUR passa a ser legítima.
Independente destes cenários, decisões do Tribunal Regional Federal da 3ª Região [5002656-14.2023.4.03.0000] – [5003946-64.2023.4.03.0000] , afastaram os efeitos da Portaria 11.266, sob o fundamento de afronta ao artigo 178 do CTN, já que revogou o benefício da alíquota 0, que tinha prazo certo e condições delimitadas aos setor de eventos.
Além disso, nos julgados foi deixado claro o rompimento com a expectativa criada pela criação do benefício e, posteriormente, a sua quebra, o que vai de encontro a segurança jurídica e boa-fé do contribuinte.
Aqui a importância de haver a delimitação temporal, já que este mesmo fundamento do art. 178 pode ser usado para combater as disposições da nova redação do art. 4º, dada pelo art. 1º da Lei 14.592 de 2023, porém, agora, pleiteando a inconstitucionalidade do dispositivo.
Tudo isso para que o contribuinte se valha do cenário oficial de março de 2022 e tenha o benefício referente a todas as atividades previstas na primeira portaria de nº 7.163, o que já fora, outrora, apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça, a exemplo do RESP nº 1.725.452 e 1.213.143 com entendimento positivo para os contribuintes.
Em relação a obrigação de inscrição no CADASTUR, no período compreendido entre 18 de março de 2022 até a publicação da Lei 14.592 perfeitamente defensável o afastamento da exigência, vez que não constava do texto da Lei, somente das normas infralegais, como já trazido no tópico anterior.
E as empresas do Simples Nacional?
Para agravar ainda mais a situação, a legislação não mencionou a aplicabilidade do benefício em tela para as empresas do Simples Nacional.
Isso se torna uma barreira, a princípio intransponível, haja vista o disposto no artigo 24 da lei nº 123 de 2006, vejamos:
Art. 24. As microempresas e as empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional não poderão utilizar ou destinar qualquer valor a título de incentivo fiscal.
Ademais, a Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil nº 2.114 de 2022 trouxe este impedimento em seu § único do artigo 4º, vejamos:
“Parágrafo único. O benefício fiscal não se aplica às pessoas jurídicas tributadas pela sistemática do Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional), de que trata a Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. “.
Devemos, contudo, elevar nossas análises para além dos aspectos legais e observar a intenção do legislador ao conceder o benefício fiscal.
Se fizermos este trabalho, analisando a justificação da lei do PERSE no projeto de nº 5.638 de 2020, veremos que não foi intenção, naquele momento, segregar empresas por regime de tributação.
Pelo contrário, o objetivo era abraçar e acalentar o setor mais prejudicado com a pandemia. Neste sentido, o artigo 146-A da Constituição Federal, vejamos:
Art. 146-A. Lei complementar poderá estabelecer critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência da União, por lei, estabelecer normas de igual objetivo.”
A partir da leitura deste dispositivo, conjugado com outros princípios constitucionais como da isonomia, livre concorrência e a situação excepcional trazida pela pandemia, concluímos que as empresas do Simples Nacional devem fazer jus ao benefício em tela.
Há decisões favoráveis nos juízos federais em 1ª instância por todo o Brasil, tanto para afastamento das exigências das limitações impostas pelas portarias do Ministério do Turismo quanto para permitir que as empresas do Simples Nacional façam à adesão ao benefício.
Vejamos o exemplo nos autos do processo de nº 1009912-75.2022.4.06.3800 da 7ª Vara Federal de Belo Horizonte que assim decidiu, liminarmente:
“Assim, se o benefício não for estendido às empresas do Simples Nacional, não se estará respeitando a livre concorrência, o tratamento favorecido para as micro e pequenas empresas e sim agraciando-se as empresas de grande porte.”.
“Ante tais fundamentos, DEFIRO o pedido de liminar para permitir que as empresas optantes pelo regime do Simples Nacional também possam usufruir dos benefícios fiscais previstos no artigo 4º da Lei nº 14.148/2021.”.
Outro ponto positivo é a manifestação da RFB do Brasil no sentido de que a qualquer momento, optando a Sociedade por outro regime de tributação, poderá usufruir dos benefícios. Vide Solução de consulta nº 52 de 2023.
Já as empresas optantes pelos demais regimes de tributação não tem com o que se preocupar em relação a este requisito, quando se fala em aproveitamento do benefício da alíquota 0.
Vale ressaltar, contudo, o impedimento da tomada de crédito de PIS e COFINS para as empresas optantes pelo regime de tributação do Lucro Real, conforme §2º do art. 4º da Lei 14.148.
E em relação aos Mandados de Segurança em curso ou para aqueles que desejam buscar seus direitos a partir de agora?
Nestes casos, os contribuintes devem analisar o cenário vigente e apresentar os fatos novos para saber se os pleitos realizados no passado perderam o objeto.
Há contribuintes que tiveram suas atividades, por exemplo, excluídas pela portaria 11.266, porém, voltaram ao texto da Lei 14.592, como é o caso dos bares. Já as atividades de consultoria empresarial foram excluídas pela portaria 11.266 e não retomaram na edição da nova lei.
Em outros casos, os contribuintes têm resultados contemplados pelos benefícios, mas não possuem inscrição no CADASTUR.
Como há vários cenários em que os contribuintes podem estar inseridos e são várias alterações e embaraços criados pelas constantes alterações de normas, imprescindível uma análise pormenorizada caso a caso.
De qualquer maneira, é importante manter a segregação de seus resultados, já o benefício da alíquota 0 se aplica somente a atividade do CNAE constante do rol e não para empresa como um todo.
Está passando por problemas com o benefício do PERSE ou quer saber como aproveitar os benefícios do programa? Conte com os especialistas do Escritório Camargo e Vieira na sua empresa!
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